OS PAIS QUE AMAM SEUS FILHOS NÃO ERRAM E OS PROFESSORES?

26-08-2010 18:30

É muito explícita e intensa a participação de alguns pais quando os seus filhos fazem parte de uma escolinha de Futsal, ainda mais quando estes pais projetam sonhos, que não conseguiram realizar quando foram mais jovens, nestes filhos tão amados. Os professores têm a obrigação de, no mínimo, saber disto.

Isto colocado, a partir do título "Os pais que amam seus filhos não erram". E os professores?, pretendo fazer alguns questionamentos em relação aos comportamentos destes pais e, principalmente, suscitar algumas alternativas para profissionais de Educação Física que lidarão ou lidam dia-a-dia em escolinhas de Futsal com esta clientela.

Neste texto, tenho a pretensão de colaborar com  algumas experiências pelas quais passei, tanto como estagiário, professor e finalmente como pesquisador e observador de alguns casos relativos a estes sucedidos, e, ainda em conseqüência disto, mostrar o amplo, complexo e importante serviço que pode ser prestado pelo professor de Educação Física que trabalha com o Futsal.

Ao longo de praticamente uma década de trabalho no meio do Futsal, este tempo vivido em escolas formais no Estado, no Município, no meio universitário, no alto nível e em algumas escolinhas de Futsal, onde os pais pagam ou não mensalidade, presenciei várias atitudes e comportamentos inadequados, tanto de pais com os professores como de professores para com os pais.

Ao começar, é interessante que fique claro que os pais "não erram", esta é uma posição de respeito ao amor em demasia que eles têm para com seus filhos. Ou seja, o professor terá que entender este fenômeno paternal, para que saiba, por exemplo, que quando o pai está na arquibancada xingando ou reclamando das opções de escalação em quadra dos alunos ou substituições feitas pelo professor, ele o faz por puro amor.

E como deverá lidar, então, este profissional com estes pais? Esta é uma pergunta que poderá ser feita e norteara este texto, sempre que outros comportamentos indesejáveis vindos destes pais ou de responsáveis pelos alunos forem surgindo. 

Normalmente, espera-se que quando o pai faz a opção de colocar o seu filho em uma escola ou escolinha de Futsal, este tenha em mente algum objetivo, que poderá ser voltado ao lazer, a recreação, aspectos ligados à saúde, entretenimento, a socialização ocupação de tempo, educação ou, ainda, na maioria dos casos, a intenção é de que o filho se torne um jogador, um futuro craque.

É exatamente diante deste último objetivo de alguns pais, em relação aos seus filhos, que acontecem os comportamentos mais inadequados, os quais presenciei em muitas oportunidades.

Como identifiquei isto? Não foi em todas as instituições que consegui fazer esta observação nítida, porque nem todas fazem (eu creio que todas deveriam fazer, de modo obrigatório) uma ficha de questionamentos e informações, na qual contenha uma pergunta básica, a respeito de qual ou quais os objetivos que levou ou levaram o pai a confiarem seu filho a nossa escola/escolinha.

Diante desta resposta, e com o passar dos meses, após várias aulas e, principalmente, jogos entre outras escolinhas e, o mais importante, a presença dos pais que têm como objetivo que o filho seja jogador, começam a surgir àqueles problemas de comportamento, como pressão no professor responsável pela condução da equipe na quadra.

Esta manifestação se dá através da opinião que "o meu filho é melhor que aquele", isto após o professor ter feito um rodízio, isto é, fez a substituição, trocando o filho daquele pai que está na arquibancada por outro que tem o mesmo direito, porém nem sempre é tão capacitado tecnicamente quanto o primeiro.

Esta é uma realidade que acontece em vários momentos durante um trabalho em escolinhas de Futsal. Como deverá lidar o professor com este pai? Neste caso pode-se, ainda, torná-lo mais complicado, para tanto basta que a situação tenha a presença de dois, três ou vários pais precionando para que os seus filhos joguem mais tempo sem que sejam substituídos.

Como lidar?

Primeiramente, temos que deixar bem definido a este ou estes pais que quando eles aceitaram os serviços da escolinha, esta em caráter obrigatório, lhes apresentou um contrato onde, entre muitas informações, está claro que se trata de uma escolinha com fins didático-pedagógicos, cujo escopo maior é o de proporcionar um processo de ensino, e que não tenha fins competivos.

Esta é uma concepção que deverá ser levada em consideração para que seja um grande material de apoio quando surgirem problemas como o mencionado.

É provável que outros tipos de questionamentos poderão surgir. Todavia, esta é uma fração da resposta a que tento sugerir.

Continuando, como lidar naquele momento da reclamação dos pais?

É salutar usar de exemplos e enaltecer o comportamento daqueles pais que, por certo também estão ali, no tocante ao "grande exemplo que eles dão aos seus filhos, comportando-se educadamente frente aos mesmos", pois apesar de o momento ser adverso (na maioria das vezes a escolinha perdeu aquele jogo) isto trata-se de uma partida de integração e que faz parte do processo de ensino e de aprendizagem, quando, então o professor, continuará  a ditar palavras de agradecimento e, principalmente, elogiando as atuações e enaltecendo vários aspectos técnicos, táticos e com ênfase maior ao respeito e a disciplina dispendida aos integrantes da escolinha adversária que, sem dúvida alguma, sem a presença deles nós não poderíamos ter realizado esta partida.

Este é um discurso muito parecido que fiz quando estive diante de um sucedido semelhante ao que mencionei.

Felizmente, ao final daquela situação, consegui agradar gregos e troianos, e o mais valioso a partir daquela data foi que o trabalho passou a ser entendido e muito mais respeitado. Mas e se eu não tivesse obtido êxito nas minhas colocações frente aos pais? Às vezes as coisas dão certas porém, às vezes...

Duas semanas seguintes tive outro final de semana com jogos de integração.

Providência tomada: Fixei em murais no ginásio as escalações, nomes e os respectivos tempos mínimos de participação de cada aluno nos jogos a serem realizados. Vale lembrar que este procedimento já vinha acontecendo, porém os pais não sabiam.

Portanto, uma dica que parece simples, mas muito eficiente: faça chegar a transparência do trabalho até os pais. Aqueles pais que sabem como está sendo desenvolvido o trabalho, dificilmente farão perguntas descabidas e também não estarão pondo em questão alternativas e principalmente o trabalho desenvolvido pelo professor.

As maneiras de agir dos pais estão intimamente ligados ao grau de instrução, renda e ocupação profissional. Esta é a conclusão que cheguei após fazer algumas observações durante quase três anos de trabalho em escolinhas de Futsal. Baseando-me pelo acompanhamento e entrevistas que fiz com pais que se faziam presentes as aulas ou que conduziam ou buscavam seus filhos no início, durante ou ao término das atividades.

Esta, a meu ver, é mais uma informação importante que deverá constar no cadastro ou ficha individual de cada aluno. Veja porque: Imagine-se tendo que explicar o processo didático-pedagógico a um pai que não saiba ler.

Agora tente com um engenheiro. E, finalmente, com um professor de Educação Física que trabalha em escola. Será que a maneira de lidar com estes pais poderá ser a mesma? Como lidar?

A afirmação que fiz em relação as maneiras de agir dos pais, quando vista no aspecto de grau de instrução, tem um infinito universo de possibilidades de se manifestar, isto é, a princípio parece que quanto maior é o grau de estudo dos pais, tanto maior será o grau de entendimento do processo de ensino ou das metodologias que estarão sendo adotadas com os seus filhos.

No entanto, cheguei a conclusão de que não é exatamente isto o que ocorre.

Pelo menos foi esta a resposta que obtive durante  o segundo semestre de 1997 e todo o ano de 1998, quando fiz algumas comparações entre os pais de alunos de uma escolinha no município de Porto Alegre.

Apesar do elevado grau de instrução destes pais eles, quando questionados sobre informações pertinentes aos seus filhos, e comparando-os com os demais pais de menor grau de instrução, sairam-se menos conscientes em relação a saber quais evoluções e desenvolvimento de habilidades que se sucederam com seus filhos e, ainda, não sabiam dizer quais os conteúdos ou habilidades que deveriam ser dadas ênfase nas aulas afim de auxiliar no melhor desenvolvimento de seus filhos.

Este estudo só foi possível graças a participação de mais um professor. Enquanto ele dava seqüência as aulas, eu fazia a abordagem e questionamentos aos pais, tanto no início, durante e no final das aulas.

O número total de pais entrevistados chegou a quarenta e um. Em certos períodos o número passou de cinqüenta, porém devido a ausências e desistências este número reduziu-se, sendo finalizado o estudo com  trinta e seis pais.

Citei este estudo porque é oportuno mencionar que há uma grande diferença de lidar com aqueles pais exaltados emocionalmente ? estes na maioria das vezes são os com menos estudos -  enquanto aqueles que apesar de estarem alienados sobre a evolução de seus filhos e são mais preparados intelectualmente, são mais fáceis de ?lidar?, isto é, explicar o porque de determinadas opções (como a verificada na substituição/rodízio, no problema citado acima). Eles entendem e aceitam educadamente a metodologia praticada.

Mas é bom lembrar: os pais não erram?

O motivo que me leva a reforçar esta afirmativa está na idéia de que, diante de praticamente qualquer problema que surja, desde o mais simples até os mais complexo, o professor tem que saber ser hábil ao lidar com os pais e, o mais importante, é fazer se deixar entender de que está sempre procurando melhorar em relação ao fato ou problema ocorrido.

Acredito que assim, o profissional estará passando uma idéia de que está sempre em busca do melhor para o filho daquele ou daqueles pais estão sendo abordados. Com esta maneira de agir, acredito que passará a existir uma confiança maior por parte dos pais em relação ao profissional e ao trabalho deste. Ou seja, terá que ser demonstrado que há uma real preocupação com problema de cada aluno de forma pessoal, individual.

Como coloquei anteriormente, a maioria dos problemas poderão ser dirimidos a partir de um contrato, onde estará lá previsto todos os aspectos, desde os objetivos, conteúdos, pedagogia e metodologia. Mas isto é uma maneira fria de lidar com os pais e os fatos. Por este motivo eu acredito que o professor deverá proceder de maneira mais humana e atenciosa com os pais e crianças da escolinha, sempre procurando ser individual na conduta dos problemas.

O motivo pelo qual eu digo que os pais que amam não cometem erro (é claro que cometem) está na diferença que existe, ou deveria existir, em torno dos conhecimentos que eles não precisam ter.

Ou seja, todo professor que for lidar com estes pais, deverá estar preparado, baseado em teorias e, também, em muitos casos, a partir de experiências no convívio diário da profissão. Que teoriais e quais conhecimentos? Ao passar pelos bancos acadêmicos, muitas são as ciências abordadas pelo futuro professor de Educação Física.

Entre elas estão psicologia, pedagogia, anatomia, biomecânica, ciências do esporte, fisiologia, antropologia, sociologia, relações humanas, didática entre outras. Será que os pais precisam estudar tudo isto para poderem escolher uma escolinha para seus filhos?

Fica nítido perceber, também, que não é muito fácil dominar tantos conteúdos. Talvez é por isto que encontramos, principalmente em alguns professores iniciantes nesta área, dificuldades de se estabelecerem com suas escolinhas. Percebam que não entrei em assuntos como administração, marketing, investimentos... isto seria assunto praticamente interminável.

Portanto, espero que tenha ficado evidente neste artigo o amplo, complexo e importante serviço que o professor de Educação Física presta à sociedade.

Todavia, é de vital significado estar preparado para lidar com os pais, tendo sempres embasamento científico e, principalmente, habilidade para abordar os problemas, procurando lidar de modo individual com cada pai. Acredito que através do exemplo colocado, muitas outras assuntos e problemáticas poderão ser abordadas e desenvolvidas em prol do Futsal. 

Autor: Prof.Carlos Tenroller CREF2/RS 238

Carlos Alberto Tenroller CREF2/RS 238 Professor na E.M.E.F. Erna Würth de Canoas/RS,nas disciplinas de Esportes Coletivos Futsal Handebol, Prática de Ensino/Estágio Supervisionado em Educação Física na Universidade Luterana do Brasil - ULBRA é o autor dos livros "Handebol:Teoria e prática" pela Sprint/2004 e "Futsal:Ensino e prática" pela editora da ULBRA em 2003

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